"Jerusa dizia que as paixões tem três fases: lírica, trágica e cómica. A lírica define-se pela lucidez e pelo encantamento.
- a chamada fase das borboletas, entende? Quando você tem borboletas voando dentro do estômago.
(...) A fase trágica, continua Jerusa, é a da concentração obsessiva no ser amado, também conhecida como período do terramoto, quer porque a cidade inteira pode cair sem darmos conta disso, quer porque a mínima decepção é um terramoto; a fase cómica seria a do desmoronamento final.
- Como uma pintura cubista. O amado se desfigura diante de nossos olhos, se transforma numa composição dissonante. E aí você não tem nem como chorar. Então o nosso riso é um uivo, enquanto rolam dentro de nós pedras de gelo.
Nas paixões brutais essas três fases podem se suceder, num atropelo, em apenas um dia.
Jerusa caída à porta de um bar na noite de Lisboa, esgotadas todas as fases.
- Porque é que estou bem mais perto de você do que você de mim?
- Como é que você pode ser tão meu, e não entender isso?
- Não se preocupe meu bem, estou seguindo as regras do AA (Apaixonados Anônimos): um dia atrás do outro. Devagarzinho".
(Os íntimos, Inês Pedrosa, Ed. Alfaguara, p. 189-190)
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